Hidrologia

vazando

Energia Assegurada

Conforme foi visto, a Energia Firme é a energia média durante o período crítico, que pode ser anual ou plurianual. Isto significa que, devido ao ciclo hidrológico anual, a energia disponível para alimentar as cargas poderá ser inferior à Energia Firme durante algum período de tempo.

Em função disso, criou-se o conceito de Energia Assegurada.

Segundo Elliot, Energia Assegurada é a máxima energia que uma usina pode fornecer durante seu pior ciclo hidrológico com uma dada demanda máxima.

De acordo com a Aneel:

"a Energia Assegurada do sistema elétrico brasileiro é a máxima produção de energia que pode ser mantida (quase) continuamente pelas usinas hidroelétricas ao longo dos anos, simulando a ocorrência de cada uma das milhares possibilidades de seqüências de vazões criadas estatisticamente, admitindo um certo risco de não atendimento à carga, ou seja, em determinado percentual dos anos simulados, permite-se que haja racionamento, dentro de um limite considerado aceitável para o sistema.

Na regulamentação atual, este risco é de 5%.

 

Desse modo, a determinação da energia assegurada independe da geração real e está associada às condições no longo prazo que cada usina pode fornecer ao sistema, assumindo um critério específico de risco do não atendimento do mercado (déficit), considerando principalmente a variabilidade hidrológica à qual a usina está submetida. Nos cálculos das energias asseguradas são desconsiderados ainda os períodos em que a usina permanece sem produzir energia por motivos de manutenções programadas e paradas de emergência.


Considera-se energia assegurada de cada usina hidroelétrica a fração a ela alocada da energia assegurada do sistema. A operação cooperativa do parque gerador brasileiro foi historicamente adotada visando garantir o uso eficiente de recursos energéticos no país. Com a introdução da competição no segmento de geração de energia e o aumento do número de agentes, optou-se pela manutenção da operação centralizada das centrais geradoras hidroelétricas visando a otimização do uso dos reservatórios e a operação com mínimo custo do sistema.


A contabilização do Mecanismo de Realocação de Energia - MRE é uma importante aplicação dos valores de energia assegurada. O MRE é um mecanismo financeiro que objetiva compartilhar os riscos hidrológicos que afetam os geradores, na busca de garantir a otimização dos recursos hidrelétricos dos sistemas interligados. A intenção é garantir que todos os geradores dele participantes comercializem a Energia Assegurada que lhes foi atribuída, independente de sua produção real de energia, desde que as usinas integrantes do MRE, como um todo, tenham gerado energia suficiente para tal.


Em outras palavras, por meio do MRE a energia produzida é contabilmente distribuída, transferindo o excedente daqueles que geraram além de sua Energia Assegurada para aqueles que geraram abaixo por imposição do despacho centralizado do sistema.


A energia gerada pelo MRE pode ser maior, menor ou igual ao total de energia assegurada das usinas participantes do MRE, conforme descrito a seguir:

  • Se a soma da energia gerada pelas usinas for maior ou igual à soma das suas energias asseguradas, haverá um excedente de energia, denominado Energia Secundária, que será também realocado entre os geradores;

  • Se a soma da energia gerada pelas usinas for menor que a soma das suas energias asseguradas, não haverá energia suficiente para que todos os geradores recebam a totalidade de sua energia assegurada. Será, então, calculado para cada gerador, na proporção de sua energia assegurada, um novo valor de energia disponível, apenas para efeito do MRE."

O cálculo da Energia Assegurada exige simulações complexas. Ela inicia com os reservatórios cheios e o balanço hidráulico é simulado durante 10 anos para estabilizar os níveis dos reservatórios. A partir desse ponto, a carga é ajustada de tal forma a obter déficit de energia em 5% das séries de vazões simuladas a partir de um universo de cerca de 2000 séries sintéticas.

A fragilidade desta metodologia é a aceitação implícita de que existirá em algum momento um racionamento de energia. Por outro lado, o critério de Elliot não nos garante resultados melhores porque o histórico de vazões medidas é muito menor do que 2000.

Resumindo, a questão da energia assegurada é básica para a geração de energia no Brasil.

Se este valor for superavaliado para um determinado aproveitamento hidrelétrico ou para o sistema como um todo, o custo de geração real e o risco de déficit serão maiores do que o previsto.

Novamente considerando o caso de Simplício apresentado anteriormente, a energia assegurada será dada, considerando o critério de Elliot, por:

eq energia assegurada

 

Onde

0,76 é o menor volume incremental mensal de toda a série;

0,9275 é o fator de produtibilidade do aproveitamento;

410,86 é a MLT do aproveitamento.

 

Observamos que este valor é muito inferior à energia assegurada calculada de acordo com a metodologia da Aneel - 191,3 MWm.

Por que estes números são diferentes?

A Tabela abaixo fornece uma pista para esta questão.

Consideremos um sistema hipotético com apenas a usina de Furnas e a usina de Simplício. Individualmente, o ano com menor volume diferencial mensal (VMA) para Simplício, conforme visto anteriormente, foi -0,76 pu em setembro de 1955 e o ano com menor VMA em Furnas foi  -0,78 em agosto 1934.

Na operação do sistema, o pior ano é o ano em que a soma das energias asseguradas de todas as usinas é mínima. Portanto, neste caso, o pior mês foi agosto de 1934 e a energia assegurada para Simplício seria de 121,94 MWm.

Isto representa um aumento de cerca de 33% com relação ao valor obtido com a metodologia de Elliot. Contudo, este mesmo efeito não ocorre para a usina de Furnas.

Usina Produtibilidade Potência MLT MLT*Prod Data VMA Eass Ano VMA Eass
  MW/m3/s MW  m3/s  MWm     MWm     MWm
Furnas 0,7726 1312,0 924,00 713,88 08/1934 -0,78 157,05 09/1955 -0,73 192,75
Simplício 0,9275 305,7 410,86 381,07 08/1934 -0,68 121,94 09/1955 -0,76 91,46
Total   1617,7   1094,95     278,99     284,21

 

Portanto, a avaliação do aumento da energia assegurada das usinas hidrelétricas, quando todas são consideradas em conjunto, é mais favorável para umas e prejudicial para outras. Para contornar este problema, a Aneel calcula a energia assegurada total do sistema e a divide entre todas as usinas pela proporção das suas potências médias, definidas como sendo a produtibilidade vezes a MLT. Neste caso, as novas energias asseguradas passariam a ser 97,09 MWm para Simplício e 181,89 MWm para Furnas. Observa-se que, neste caso, ambas as usinas passariam a ter uma energia assegurada superior ao valor original individual proposto por Elliot: Simplício +6,2% e Furnas +15,8%.

Outra questão importante é o papel dos reservatórios no cálculo da energia assegurada. Apesar de possuir um reservatório, Simplício operará a fio dágua.

No entanto, Furnas possui um grande reservatório com volume útil de 17,217 km3, sendo o maior reservatório da região sudeste e centro oeste e responsável por 18% da capacidade de armazenamento  da região.

 

Tabela Energia Assegurada